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Circo Negro: ousadia e maturidade na peça da CiaSenhas que faz últimas apresentações neste fim de semana

Ciliane Vendruscolo, Luiz Bertazzo, Rafael di Lari e Greice Barros em Circo Negro, adaptação do texto de Daniel Veronese pela CiaSenhas de Teatro. Foto: CiaSenhas/Divulgação.

Eu confesso: não foi fácil escrever sobre Circo Negro, a peça da CiaSenhas de Teatro que permanece em cartaz até domingo, dia 30, no Espaço da Cia. dos Palhaços (R. Amintas de Barros, 307 – Centro). Há algumas razões para esta dificuldade. A primeira delas é a de se desfazer do arrebatamento inicial, que se estabelece com o início da peça e perdura – por um longo período – depois do seu encerramento. Sim, é pra se entusiasmar e, particularmente, fiquei feliz não só com o espetáculo, mas também o momento a que chegou a companhia.

Tal arrebatamento, quando impregnado por esta tal felicidade, não representa um bom termômetro para a crítica – ou resenha crítica, ou análise, ou pitacos, porque não sei precisar qual a matéria de um texto como este que coloco aqui –, uma vez que ela exige o tal distanciamento que permite avaliar a coisa pela coisa em si – e não a coisa a partir de como eu a vejo enfim. O problema é que, não bastasse um arrebatamento, eu precisei assistir à peça uma segunda vez, o que prolongou o sentimento inicial e me afastou do distanciamento pretendido. É por isso que, se fosse preciso dizer algo sobre ela agora, de pronto e sem amarras, confiando apenas no entusiasmo, diria: “É linda! Corra pra ver”. Simples assim. Mas mesmo me forçando a um distanciamento (necessário), não há como evitar o imperativo. Portanto, corra! E corra mesmo porque este é o último fim de semana.

Assumir esta indicativa é outra razão de dificuldade para me colocar em relação à obra. Significa que eu a indico para o público, o que é verdade, mas não sei se todos os públicos veriam na peça a graça que eu vi – embora seja difícil não gostar do que se vê no pequeno espaço da Cia. dos Palhaços.

Rafael di Lari, Luiz Bertazzo e a morte em cena. Foto: CiaSenhas/Divulgação.

Filosofias (mequetrefes, que se diga) à parte, vale justificar por que Circo Negro causa tanto entusiasmo – e por que merece ser vista. A primeira razão está no momento ao qual chegou a CiaSenhas, que mencionei no começo do texto. Eu não acompanhei de perto o trabalho do grupo que existe há mais de uma década até o fim do semestre passado, quando a companhia recapitulou três de seus espetáculos mais recentes (Homem Piano, Delicadas Embalagens e Concerto para Rameirinhas) em uma pequena mostra de repertório, algo que poderia existir mais se não fossem os entraves todos (que quem de arte vive sabe quais são).

Consegui assistir aos três e fiquei impressionado. Parte disso se deve ao fato de as três peças buscarem, no olhar para o público, uma repercussão que se dá em cena, entre os atores. Outro fato que me marcou foi a consistência da dramaturgia desenvolvida pela companhia – uma dramaturgia que se aprimorava e se sofisticava a cada uma das peças.

E, então, depois da recapitulação, surge Circo Negro, uma adaptação do texto do atualmente celebrado dramaturgo argentino Daniel Veronese. Processos de adaptação à parte, o texto de Veronese, originalmente concebido para bonecos, foi transposto para o palco com quatro atores, levando em conta questões importantes para a companhia, segundo Luiz Bertazzo, um dos atores da peça.

Mais do que isso: o texto é usado como meio para a expressão de outras questões que, hoje (e diferentemente das três peças que o grupo recapitulou), com Circo Negro, parecem incorporadas à companhia: a ideia de realismo (importante antes) que se dissolve em uma estrutura nada realista, o gesto imbuído de significação e a emoção que surge independente da narrativa. Três questões apreendidas a partir do texto de Veronese e desenvolvidas a partir do olhar para o público, da percepção do expectador, um elemento que dita a razão de ser da cena, do espetáculo como um todo – pelo menos, é a percepção que tenho, e que fica evidente já no início de Circo Negro.

Emoção e representação: Ciliane Vendruscolo e Greice Barros dão vida a um conto russo em meio à peça. Foto: CiaSenhas/Divulgação.

Aliás, é já no início do espetáculo que se percebe que ele é fruto da maturidade de um grupo que, com Circo Negro, busca inovar a partir de um desafio formal e estético ao qual ele mesmo se coloca. Parte deste desafio está no diálogo que procura estabelecer com um texto que não é de autoria própria (no caso, da diretora Sueli Araújo, que também assina a direção de Circo Negro) e, mais, que pertence a um dos mais importantes dramaturgos latino-americanos da atualidade. Outra parte está na concepção dramatúrgica nada fabular (um salto em comparação aos outros espetáculos) que coloca este texto – e as questões da companhia – em cena.

É aí que a coisa pega – e esta talvez seja a principal razão do meu arrebatamento. Nada do que se pretende com a peça faria sentido se ela não tivesse calcada na atuação de seus atores – ainda mais quando a peça tem como ponto central a representação. E mais, se não fosse o grupo tão coeso. Chama a atenção o fato de tal unidade ser obtida mesmo quando há dois atores novos em cena: Ciliane Vendruscolo e Rafael di Lari, que se juntaram a Greice Barros, Bertazzo e à companhia para a o espetáculo.

Bertazzo em cena. Foto: CiaSenhas/Divulgação.

Mas, apesar da coesão e afinação do elenco, Circo Negro não só evidencia, como confirma o talento de Luiz Bertazzo, um dos mais evidentes na atual cena curitibana. É dele os melhores momentos da peça, como quando se transforma em leão ou quando descreve a sintomatologia de sua própria morte no palco.

No fim das contas (e até porque o texto já se faz longo), Circo Negro não é um espetáculo para ser entendido. “É pra ver o circo acontecendo”, diz Bertazzo, com quem falei na tentativa de saber mais sobre a peça. De fato, é para ser visto, antes de tudo. Contemplado, que seja, e sentido, do início ao fim. E, fazendo eco ao diálogo relatado por Luciana Romagnoli no início do seu texto sobre a peça (leia aqui), relevante para cruzar as fronteiras da cidade e ser vista por outros olhares.

CIRCO NEGRO

Últimas apresentações: sexta (28) e sábado (29), às 20h; domingo (30), às 18h e às 20h.

Local: Espaço Cultural Cia. dos Palhaços (R. Amintas de Barros,307 – Centro).

Ingressos: R$ 10 e R$ 5 (meia entrada)

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Suave Napalm: montagem impactante do texto caleidoscópico do dramaturgo inglês Philip Ridley

Espetáculo permanece em cartaz até a próxima sexta-feira, dia 24, no Indra, espaço de eventos do Rebouças, com apresentações de terça a sexta às 21h

Suave Napalm, peça do inglês Philip Ridley dirigida por Paulo Barros, com Guenia Lemos e Gustavo Lorenzo no elenco. Foto: Milcho Pipin.

Um tsunami coloca dois jovens isolados em uma ilha. Diante deles, somente o outro e um universo que se desdobra em imagens impressionantes, fantásticas. Entre eles, o desejo – e um desejo que se materializa poeticamente em imagens perturbadoras como balas de revolver suavemente lançada por entre os lábios e uma granada que entope o sexo e explode – e uma disputa.

Aos poucos, o dissabor que se instaura nesta zona de conflito envolve, também, a plateia e, depois, dissipa-se. O rapaz sai para enfrentar uma terrível, enorme serpente que ameaça a ilha enquanto ela o assiste. Depois, ela relembra os preparativos para uma grande festa que marcou sua adolescência. Depois, o desejo volta a se instaurar entre eles. Depois, surge um unicórnio e assim, sucessivamente, vão se repetindo, como que em um caleidoscópio, imagens, memórias, aspirações, culpas e desejos na voz de dois jovens aprisionados em um cenário idílico, lançados ali depois de um cataclismo inicial. No caso, um trauma que vai se descortinando lentamente, revelando o drama de um casal em um momento extremo de suas vidas, aquele em que o amor acaba e a vida a dois se torna uma disputa pela sobrevivência.

É deste lugar insólito, no qual o amor, inevitavelmente, pode aprisionar duas pessoas, que surge Suave Napalm, peça do polêmico escritor e dramaturgo inglês Philip Ridley que ganhou versão nacional pelas mãos do ator e produtor Gustavo Lorenzo. Impactante, a montagem, dirigida pelo cineasta paulista Paulo Barros, economiza nos efeitos de luz e som e se concentra na atuação dos seus dois atores (Lorenzo e Guenia Lemos), que se movimentam, constantemente, no palco transversal enquanto dão vida às histórias, fantasias e desejos dos dois personagens.

Um dos méritos no texto é a sugestão. Não há nada, visualmente, gráfico na peça. Ela se constrói por meio da linguagem, verbal ou corporal, e adquire contornos, ora explosivo e castrador, ora suave e, até mesmo, engraçado, conforme se desenrola o embate entre o casal. Por vezes, o texto acaba se tornando lento e cansativo; por vezes, a carga explosiva em cena perde forças; por vezes, o desejo não se evidencia tão sensual quanto poderia. Porém, isso não compromete o espetáculo que, no fim das contas, é cativante e intenso. Incendiário mesmo, em referência ao próprio napalm, substância usada nos lança-chamas. Em muitos sentidos.

Suave Napalm

Indra

R. Dr. Reynaldo Machado, 89 – Rebouças

De terça a sexta-feira, às 21

Até o dia 24 de agosto

Ingressos: terça e quarta-feira, R$ 20; quinta e sexta-feira, R$ 30

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Exposição: desdobramentos da experimentação cênica ganham espaço no Novelas Curitibanas

Peça transpõe para o palco ideais artísticos que marcaram as obras de Lygia Clark e Hélio Oiticica nos anos 60 e instiga uma nova percepção do fazer teatral

Exposição: ideais artísticos de Lygia Clark e Hélio Oiticica dão a tônica do espetáculo que investe na experimentação cênica. Foto: Leco de Souza/divulgação.

Compilações de trechos de cartas de Hélio Oiticica para Lygia Clark, entregues em uma única carta ao espectador antes do início espetáculo, sinalizam o que pretende ser Exposição, peça do coletivo Couve-Flor que está em cartaz até 26 de agosto no Teatro Novelas Curitibana com entrada franca. Exposição é uma “grande sala de experimentação” na qual atores e diretor se expõem em um tipo diferente de contato com o público, um público que, também ele, experimenta uma forma distinta de encarar – e a palavra é esta – a experiência cênica que se apresenta.

Concebida a partir das cartas trocadas entre Oiticica e Clark de 1964 a 1974, a peça transporta para o espaço cênico os ideais dos dois artistas que revolucionaram as artes plásticas brasileiras na segunda metade do século XX, alterando as percepções de tempo e espaço da obra de arte e do papel do espectador em relação a ela, fazendo dele sua parte integrante e seu coautor. Não só transporta como também se apropria desses ideais: sai a obra de arte e entram a experiência cênica e o fazer teatral, compartilhados com o público de modo que ele também atue na sua construção. Ou melhor, na sua conclusão, como de fato se dá em Exposição.

Até chegar a este desfecho “interativo”, o espetáculo é uma grande discussão sobre a possibilidade de experimentação e uma prova de como ela pode existir no espaço cênico. Da entrevista coletiva que abre o espetáculo até o discurso do ator Eduardo Simões sobre a natureza da proposta que colocam para a plateia, tudo converge para esta possibilidade que, de fato, acontece. É um preparo e um convite que, claro, não precisa ser aceito, mas se torna irrecusável para alguns.

Com dramaturgia assinada por Dimis Jean Sores, que também divide a direção com Cândida Monte e Gustavo Bitencourt, Exposição recebeu a colaboração da premiada diretora e encenadora paulista Cibele Forjaz, que trouxe para o Festival de Teatro de Curitiba deste ano o seu aclamado O Idiota – uma novela teatral – e que retorna à capital paranaense para um bate-papo sobre Exposiçãono dia 19 de agosto

Eduardo Simões em cena de Exposição. Foto: Leco de Souza/divulgação.

também no Novelas. Dividida em quadros, a peça é um desdobramento desta possibilidade de experimentação, numa sucessão de recortes que versam sobre a obra teatral, o ato de representar, os limites da encenação etc. É metalinguagem enfim. E, de novo, metalinguagem.

Usar uma peça para discutir o fazer teatral tem sido uma aposta recorrente nisso que se chama nova dramaturgia, principalmente entre grupos mais jovens. Faz sentido. Afinal, como fazer algo novo quando, aparentemente, tudo já foi feito em termos de dramaturgia? No entanto, esta aposta não só tem se tornado repetitiva, como também pouco expressiva em termos de produção espetáculos relevantes.

Exposição incita uma curiosidade e um olhar atento para aquilo que propõe. Diverte em muitos momentos e consegue ser genial em alguns de seus quadros – o improviso do ator que tem três minutos para fazer o que quiser em cena, a bajulação que se segue e a ligação da atriz insegura para o diretor que teme ser colocada a prova (atuação impagável de Mariana Ribeiro) são alguns deles –, mas peca pela falta de coesão e um senso de unidade que permita entendê-la como uma obra teatral como tal. Não que isso a comprometa como espetáculo e espaço para a experimentação cênica. O envolvimento do público, até mesmo durante a interação final, dá provas de que a peça agrada. Isso diz muito, ainda mais quando o que se quer passar nem sempre faz sentido para a plateia.

Exposição – um espetáculo teatral

Teatro Novelas Curitibanas

R. Pres. Carlos Cavalcanti, 122 – São Francisco

De quinta a domingo, às 20h

Até o dia 26 de agosto

ENTRADA FRANCA

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Oxigênio: peça da Cia. Brasileira de Teatro de volta a Curitiba no 2º Palco Giratório

Oxigênio, da Cia. Brasileira de Teatro, de Curitiba. Foto: Cia. Brasileira de Teatro.

Depois de passar por diversas cidades brasileiras durante este ano, Oxigênio retorna aos palcos curitibanos para duas apresentações dentro da programação do 2º Palco Giratório, festival do Sesc que começa hoje, às 13h, com a apresentação de A Barca, espetáculo do Grupo Grial de Dança, de Pernambuco, no Sesc Paço da Liberdade. A peça da Companhia Brasileira de Teatro, dirigida por Márcio Abreu, é uma das principais atrações do festival que traz diversos espetáculos até o dia 31 de agosto (confira a programação completa no site http://www.sescpr.com.br/palco-giratorio/). Abaixo, coloco minha crítica da peça, publicada depois de sua passagem pela mostra Na Companhia de…, do Festival de Teatro de Curitiba.

Oxigênio tem apresentações nesta quinta e sexta-feira, dias 2 e 3 de agosto, às 20h, no Sesc da Esquina (R. Visconde do Rio Branco, 969). Entrada gratuita para comerciários e ingressos a R$ 6 e R$3 (meia entrada) para não comerciários.

 

“Oxigênio”: montagem inventiva e impactante de Márcio Abreu*

Premiada peça da Cia. Brasileira de Teatro fechou o Festival de Curitiba

Patrícia Kamis e Rodrigo Bolzan em Oxigênio. Foto: Elenize Dezgeniski/Gazeta do Povo.

No homem, há sempre dois dançarinos, o esquerdo e o direito. Um é o pulmão direito, o outro, o esquerdo. Ambos, dentro do peito, dançam. E se, por alguma questão externa, uma pancada de pá, por exemplo, esses dois dançarinos deixam de dançar – é porque lhes falta oxigênio.

Em linhas gerais, este é o argumento central de “Oxigênio”, a peça da Companhia Brasileira de Teatro dirigida por Márcio Abreu que encerrou a mostra Na Companhia de…, que integrou o Fringe, neste fim de semana, com apresentações no sábado e no domingo do Teatro HSBC. A partir dele, o espetáculo torna-se uma sucessão de fatos que se sobrepõem naquilo que se pode chamar de “uma grande discussão” sobre o que é essencial na vida – ou melhor, na experiência – humana, tendo como ponto de partida um crime: Sasha, um homem do interior da Rússia, esquarteja sua esposa com uma pá depois de se apaixonar por uma garota de Moscou que, coincidentemente, tem o mesmo nome que o seu.

Adaptação da obra do autor russo Ivan Viripaev, “Oxigênio” estreou em Curitiba no fim de 2010, sucedendo Vida, a peça que não só firmou a Cia. Brasileira na cena teatral nacional, mas também elevou Márcio Abreu ao panteão dos grandes realizadores teatrais brasileiros, um fato que se confirmou nesta edição do Festival de Curitiba.

Além de “Oxigênio”, Abreu assinou a direção do ótimo “De Verdade”, peça que teve estreia nacional na Mostra Oficial, com Guilherme Piva e Kika Kalache no elenco, e reapresentou Isso te Interessa?, peça que também integrou a mostra Na Companhia de…, que contou com a curadoria da própria Cia., e foi apontada pela crítica nacional como o grande destaque do festival deste ano – ele ainda assina direção de Cyrk, circo musical do Trio Quintina que também foi exibido na mesma mostra. Na mostra paralela de 2011, Oxigênio já havia sido apontado como um dos destaques de todo o festival, o que impulsionou a carreira nacional do espetáculo, que segue em turnê pelo país neste ano dentro da programação do Festival Palco Giratório do SESC – que chega a Curitiba em agosto.

O espetáculo funciona como que uma espécie de continuação do trabalho de pesquisa do grupo e que já havia sido impresso em Vida: sem as amarras da representação, os dois atores em cena – Rodrigo Bolzan e Patrícia Kamis – contam a história em pequenos capítulos ou composições que partem sempre de algum tipo de pressuposto moral.

A paixão entre Sasha e menina de mesmo nome é somente o pano de fundo para que os atores assumam um papel que não é o dos personagens, mas como que porta-vozes de questões que, aparentemente, sempre leva o público a pensar sobre o que vem a ser essencial para cada um – o que faz os pulmões dançarem –, misturando música e encenação em uma montagem inventiva, algo verborrágica, é verdade, mas impactante – que seria também o adjetivo perfeito para caracterizar a atuação do elenco, principalmente de Bolzan, recentemente eleito melhor ator no 1º Prêmio Questão de Crítica e na etapa São Paulo do Prêmio Shell, eleito o mais importante do país – da mesma forma que uma pá no peito.

* Texto publicado originalmente em 10/04/2012 na página do Festival de Teatro de Curitiba da Gazeta do Povo Online. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/festivaldecuritiba/conteudo.phtml?id=1242836.

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Memórias reinventadas ganham espaço em O Jardim*

 

O Jardim, da Cia. Hiato. Foto: Divulgação/Gazeta do Povo.

Aclamado como um dos melhores espetáculos de 2011 pela crítica nacional, O Jardim, do jovem dramaturgo Leonardo Moreira, estreou na quinta-feira na mostra oficial do Festival de Teatro de Curitiba, com sessão lotada no Cietep (Av. Comendador Franco, 1341), e tem mais duas seções neste sábado, às 19h e às 21h. A apresentação confirma a trajetória da peça que rendeu ao diretor o seu segundo Premio Shell de Teatro – Etapa São Paulo consecutivo de melhor autor. Inventiva em termos de estrutura narrativa, a montagem, que tem como tema central a memória, também emociona o público com sua saga familiar vista em três momentos distintos, todos encenados simultaneamente.

Dividido em blocos de caixas de papelão, o cenário de Marisa Bentivegna – também premiado com Shell – separa cada um dos fragmentos da história: quando Thiago e Fernanda se separam, em 1938; quando Thiago será mandado para um asilo por causa do Alzheimer, em 1979; e quando Aline, neta de Thiago, está deixando a casa com o jardim onde tudo se passa. Dependendo da posição que o espectador assume na plateia também dividida, ele assiste a uma das cenas que, durante o espetáculo, vão se revezando no palco fragmentado. Ao mesmo tempo, as caixas que dividem o cenário vão, pouco a pouco, sendo retiradas, abrindo espaço para reminiscências de cada momento da história – e provocando a memória do espectador, que pode se envolver com algumas das situações apresentadas na peça.

O Alzheimer e a esquizofrenia foram os pontos de partida para a construção do espetáculo que se vale, também, de recordações do diretor e do elenco do grupo criado por ele em São Paulo, a Companhia Hiato, transformadas em ficção – embora os personagem tenham os nomes dos próprios atores. É desse material humano que se serve Moreira para falar sobre a memória – a das lembranças perdidas, passadas e presentes – em uma estrutura que, como a própria memória, é composta por momentos que coexistem – e só fazem sentido quando colocados lado a lado.

Alternando cenas de grande dramaticidade e momentos cômicos, O Jardim é como uma metáfora sobre a vida – e sobre como nos lembramos, ou não, dela. Com elenco afinado – destaque para as atuações de Fernanda Stefanski, a mulher abandonada por Thiago em 1938; Paula Picarelli, a empregada da neta de Thiago em 2011; e de Edison Simão, no papel de um Thiago velho, acometido pelo Alzheimer, em 1979 – a peça cativa o público, que sai tocado pela sensibilidade da montagem e com a delicadeza que explora os seus temas.

* Texto publicado originalmente em 07/04/2012 na página do Festival de Teatro de Curitiba da Gazeta do Povo Online. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/festivaldecuritiba/conteudo.phtml?id=1242067.

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Licht+Licht é uma “ópera seca” que discute o papel do artista na sociedade*

Baseada em Goethe, montagem de Caetano Vilela prioriza a encenação em uma peça que deixa perguntas no ar

Wagner Antônio, Fabiana Gugli e Germano Melo (ao fundo), elenco enxuto em montagem baseada em Goethe. Foto: Rubens Nemitz Jr./Gazeta do Povo.

Quando Caetano Vilela adaptou Travesties, texto do dramaturgo norte-americano Tom Stoppard, em 2010, ouviu-se aqui e ali que ele havia exagerado. As liberdades tomadas, principalmente em relação aos personagens, dentre eles James Joyce, não agradaram certa parcela do público – talvez a mais erudita ou que conhecesse o texto original de Stoppard que, só no ano passado, ganhou tradução no Brasil. No entanto, Travesties era uma obra coesa, grandiosa em certo sentido, com enredo amarrado e deliciosamente engraçada com sua sátira sobre o papel do artista na sociedade.

Em Licht+Licht, que estreou ontem no Guairinha, dentro da Mostra Oficial do Festival de Curitiba, ele volta ao tema, mas, ao invés de uma adaptação, o texto – se é que há um, questionam-se os atores Germano Melo, Fabiana Gugli e Wagner Antônio no palco – é uma criação do próprio diretor, inspirado em três obras centrais de Goethe: Os Sofrimentos do Jovem Werther, Fausto e Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister. Há outro “mas”: embora Licht+Licht traga elementos que foram marcantes em Travesties – a grandiloquência algo operística, o cenário e iluminação impecáveis, Germano Mello, o protagonista de ambas, e livros, muitos livros – a nova peça não se assemelha à primeira no aspecto que mais a caracterizava, o da narrativa.

É curioso que o segundo trabalho de Vilela à frente da Companhia da Ópera Seca não só apareça depois de Gargólios, o espetáculo de Gerald Thomas que estreou em São Paulo e teve sessões na mostra deste ano no início da semana, como também tenha sido apresentada na sequência. Em 2009, Vilela assumiu o posto de Gerald depois que ele, Gerald, largou a toalha e se mandou para Nova York, onde reside, e Londres, onde montou a versão inglesa da companhia brasileira, a Dry Opera, com a qual veio com a peça para Curitiba.

Quem assistiu a um e outro pôde perceber semelhanças na estrutura dos espetáculos. Talvez até de tema – mas enquanto Gerald carrega no tom político, Vilela envereda pelas referências artísticas que lhe são caras e importantes, transpondo-as todas em Licht+Licht, mesmo que o público não as perceba.

Com seu segundo trabalho, verifica-se a existência de dois Vilelas: o de Travesties e o de Licht+Licht, no qual os pressupostos de Gerald Thomas e de sua ópera seca estão mais evidentes. São dois espetáculos diferentes e, por isso, é difícil valorar qual dos dois é melhor. Até porque a natureza de ambos os trabalhos também é diferente, embora a metalinguagem e a discussão do artista na sociedade possam ser temas comuns. No entanto, entender o recado em Licht+Licht é mais difícil.

Vilela sabe disso e permite que seus atores reverberem esta questão. “Alguém vai entender a peça”, solta Germano Melo, que funciona como um alter ego do diretor, uma figura também cara a Gerald – e, espertamente, o diretor coloca esta dúvida em cena como se ele próprio, por meio de seus personagens, duvidasse do método que preconiza. A frase arranca gargalhadas da plateia, com se ela concordasse com a dificuldade que se apresenta. Ainda mais quando a encenação é mais importante que a construção narrativa baseada em Goethe.

É preciso dizer que o escritor alemão está lá como a luz a que evocou na sua última frase antes de morrer, “licht mehr licht” (“luz, mais luz”), mas algo sugerido, assim como os seus personagens. Os valores preconizados pelo autor romântico – e importantes para o diretor – como cidadania, ética, respeito à natureza e o papel da arte na sociedade também estão lá, ora sugeridos, ora defendidos com rigor – a questão da contrapartida social do artista é colocada em destaque nos momentos finais da peça. Porém, diferentemente de Travesties, lhes falta coesão, o que dilui a importância deles para o público, mesmo que o diretor lance luzes – todas as luzes possíveis, diga-se – sobre eles.

Aliás, também é preciso dizer que Vilela é, antes de tudo, um iluminador. “E o que é essa luz?”, pergunta, de novo, Melo que, agora, interpreta a si mesmo na peça. Depois, tem uma vasta carreira como diretor de óperas. Depois, e só depois, ele se tornou diretor de teatro. Isso não significa que não desempenhe a função com competência. Pelo contrário. Por causa dessas experiências, seus espetáculos se tornam mais interessantes: é pela luz que ele conduz Licht+Licht, que ganha contornos operísticos pelas marcações estabelecidas em cena e pelos trechos de óperas que permeiam a estrutura da peça.

No entanto, por fim, Licht+Licht deixa perguntas desatadas no ar e, perto de Travesties, um certo dissabor, o que só aumenta as expectativas em relação aos novos trabalhos que Vilela promete para o ano que vem – Tetralogia, uma adaptação de quatro óperas de Richard Wagner em um único espetáculo, e Brutos, desenvolvida a partir de Júlio César de Shakespeare. Que eles venham, mesmo ofuscando a plateia com as suas luzes incandescentes.

* Texto publicado originalmente em 05/04/2012 na página do Festival de Teatro de Curitiba da Gazeta do Povo Online. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/festivaldecuritiba/conteudo.phtml?id=1241563.

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Vivienne é teatro falando do próprio teatro*

Peça da mostra Coletivo de Pequenos Conteúdos surpreende com montagem debochada e inteligente

Sávio Malheiros e Patrícia Cipriano em cena de Vivienne, peça divertida que satiriza a construção do teatro contemporâneo. Foto: Rubens Nemitz Jr./Gazeta do Povo.

Vivienne é uma escritora em crise criativa. Depois do sucesso alcançado aos 12 anos com a publicação de um romance sobre um menino judeu escondido sob o assoalho, ela nunca mais conseguiu repetir o seu feito infantil. Agora, perto dos 30 anos, com outras preocupações na cabeça, dentre elas a possibilidade de um AVC, ela quer deixar uma marca, mas não tem ideia, apenas algumas frases soltas sobre o amor.

Encontramos uma Vivienne alucinada quando entramos no TUC – Teatro Universitário de Curitiba, onde a peça que leva o nome da personagem está sendo exibida até sábado. Uma seleta plateia é convidada a assistir ao espetáculo em cadeiras espalhadas pelo palco, o que a torna participante e cúmplice dos tormentos da escritora que, desesperadamente, procura algo inédito e bom para escrever, mas não consegue, nem com a ajuda dos amigos que se aglomeram no seu apartamento.

Aliás, é normal que amigos sejam condescendentes quando colocados no papel de críticos. Há laços mais importantes que precisam ser mantidos e é por isso que a crítica, seja ela positiva ou negativa, dá lugar à simples bajulação. É preciso que um escritor célebre, que surge na peça na forma de um assado para ser devorado por comensais sedentos de arte e inspiração, mostre a Vivienne o caminho para o seu sucesso. É a partir daí que “Vivienne”, não mais a personagem, mas a peça, envereda sobre o tema que quer explorar: o teatro contemporâneo.

Satírico, o espetáculo faz rir – e muito –dos pressupostos artísticos que ditam a construção do teatro atual: pegue um fato cotidiano – a crise criativa, por exemplo – e o envolva em meio ao caos de ideias, sentimentos e personagens, tendo como mote a metalinguagem – o teatro falando do próprio teatro. Junte um pouco de filosofia e algo de mistério – aquilo que o público não vai reconhecer de imediato – ao texto e o entregue a um diretor consagrado, que possa desconstrui-lo de acordo com a sua própria dramaturgia. E deixe, por fim, que o crítico, o grande vilão de Vivienne, a peça, desenvolva as teorias que, no fim das contas, estão fadadas à morte.

É uma maneira de ver as coisas e “Vivienne” acerta justamente por não se levar a sério. Despretensiosa, ela se torna um jogo divertido e cheio de qualidades: o cenário caótico, o texto rápido e irônico, e um elenco que, embora desigual, torna o espetáculo agradável. O destaque vai para Patrícia Cipriano, atriz que dá vida à protagonista, e sua atuação algo neurótica e exagerada, mas delicada em certo sentido, que causa empatia e faz rir em muitos momentos.

Desenvolvida por um grupo de atores como trabalho de conclusão do curso de artes cênicas daFaculdade de Artes do Paraná, a montagem surpreende em meio à produção de grupos iniciantes. Isso não significa que não haja tropeços. Na tentativa de caracterizar tudo o que sinalizam como elementos deste teatro contemporâneo, algumas situações não se encaixam na narrativa e são lançadas na peça apenas para arrancar gargalhadas da plateia – o que funciona, é verdade, mas que também dá provas de inconsistência.

Personagens deslocados e atuações afetadas também minimizam o sabor agradável da peça, que muitas vezes peca pelo exagero. Logicamente, ele é proposital, mas parece diminuir o impacto das questões que, mesmo em meio ao absurdo e ao cômico, são importantes para o jovem grupo de atores – afinal, são eles que colocam essas questões em cena.

Problemas à parte, “Vivienne” é uma grata surpresa. Leve, irreverente e debochada, a peça merece ser vista, se não pelo tema que propõe, pelo menos para se ter boas risadas.

* Texto publicado originalmente em 05/04/2012 na página do Festival de Teatro de Curitiba da Gazeta do Povo Online. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/festivaldecuritiba/conteudo.phtml?tl=1&id=1241454&tit=Vivienne-e-teatro-falando-do-proprio-teatro.

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Espetáculo de rua emociona público*

Vencedor do Troféu Gralha Azul do ano passado, “A Pereira da Tia Miséria” recebeu aplausos acalorados em última apresentação no Fringe

Adaptação de um conto popular espanhol, A Pereira da Tia Miséria é o primeiro espetáculo do Núcleo Às de Paus, de Londrina. Foto: Fernando H. Oliveira/Gazeta do Povo.

Filho da Miséria, Fome saiu pelo mundo sem paradeiro e o público é convidado a aguardá-lo ao lado de sua mãe e outros personagens que se reúnem ao redor de uma pereira, única fonte de alimento para dois garotos que esperam a ausência de Tia Miséria para subir na árvore e roubar os seus frutos. Enquanto Fome não volta, Miséria não arreda o pé de perto da sua pereira, nem mesmo quando a Morte vem lhe visitar. A senhora idosa engana a Morte e decide viver para esperar o filho que nunca retorna e, por causa dele, o mundo padece.

Adaptação de um conto popular espanhol, “A Pereira da Tia Miséria” é o primeiro espetáculo do Núcleo Às de Paus, grupo de teatro de rua criado em Londrina em 2008. No último sábado, dia 31 de março, a companhia fez a sua última apresentação no Fringe deste ano – o terceiro do qual participa. Foi, também, a 70ª exibição da peça que já percorreu diversos estados brasileiros e, no ano passado, recebeu o Troféu Gralha Azul, concedido pelo governo do Paraná aos melhores do teatro estadual, nas categorias de melhor espetáculo, ator (Guilherme Kirchheim) e figurino.

O prêmio, pela primeira vez entregue a um grupo fora de Curitiba, coroou a trajetória de um espetáculo fabuloso que coloca seus atores sobre pernas de pau e reúne diversos elementos do teatro popular para contar uma história mágica que fala a todos os públicos e emociona a plateia. Prova disso foram os aplausos empolgados de um público numeroso que se reuniu ao redor da pereira da Tia Miséria no fim de tarde de sábado (31) noLargo da Ordem.

A princípio, a apresentação estava prevista para acontecer às 16 horas na Praça da Espanha, mas por conta dos shows que aconteciam dentro da programação do Empório Soho, evento gastronômico que ganhou a praça na sexta e no sábado, o espetáculo precisou ser transferido, na última hora, para o Largo. A mudança repentina gerou descontentamento do público que aguardava a apresentação na praça e precisou se deslocar do Batel até o centro histórico.

Idas e vindas à parte, quem aguardou para assistir à peça teve a oportunidade de conferir um trabalho sensível de um grupo que, apesar de jovem, dá provas de maturidade e talento. “A Pereira da Tia Miséria” não é só “uma história pra cantar”, como anuncia o elenco, em coro, no início do espetáculo. É pra se guardar, com carinho, na memória.

* Texto publicado originalmente em 02/04/2012 na página do Festival de Teatro de Curitiba da Gazeta do Povo Online. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/festivaldecuritiba/conteudo.phtml?id=1240209.

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“Palácio do Fim”: uma realidade distante, mas que fala a todos nós*

Vera Holtz em “Palácio do Fim”: confissões da barbárie e da dor que ganham voz em um espetáculo difícil. Foto: Divulgação/Gazeta do Povo.

Montagem densa de José Wilker com Camila Morgado, Antonio Petrin e Vera Holtz cala e emociona o público

 

Três relatos distintos sobre o terror no Iraque se intercalam em “Palácio do Fim”, peça dirigida por José Wilker que estreou neste sábado (31) na Mostra Oficial do Festival de Curitiba e que faz, neste domingo (1º), às 21 horas, sua segunda e última apresentação. São visões particulares de três personagens reais ligados a diferentes momentos da história do país, o do regime de Saddam Hussein e o da recente ocupação americana. Ou melhor, são confissões da barbárie e da dor que ganham voz em um espetáculo difícil, impactante e emotivo que, apesar dos aplausos acalorados ao final da sessão, calou o público que lotou o Teatro Bom Jesus.

Não seria por menos. O título da peça escrita pela canadense Judith Thompson é uma referência ao palácio de governo de Saddam Hussein e as suas câmaras de tortura. Sabemos o que se passou ali pelo relato da militante comunista Nehrjas al Saffarh. Não vemos a tortura do seu filho de 8 anos, só ouvimos a sua descrição. Mas, na voz de Vera Holtz, é como se a tivéssemos assistindo.

A força da palavra é maior do que a da barbárie e é nela que está centrada a montagem densa de Wilker que, além de Vera Holtz, tem Camila Morgado e Antonio Petrin no elenco. O texto original colocava três monólogos em sequência, mas o diretor preferiu intercalá-los em blocos, deixando os atores o tempo todo no palco, entrando e saindo de cena num jogo de luzes estupendo que, no fim das contas, é o único elemento de ação que vemos durante todo o espetáculo.

Ao relato da militante iraquiana morta em um bombardeio durante a Guerra do Golfo em 1993, juntam-se o de Lynndie England (Camila Morgado), a soldado norte-americana que teve suas fotos torturando prisioneiros políticos na prisão de Abu Ghraib divulgadas em 2004, e o de David Kelly (Petrin), o especialista em armas britânico que relatou exageros no relatório sobre a presença de armas químicas no Iraque – o que justificou a guerra em 2002 – e foi encontrado morto em 2003.

Vemos Kelly, justamente, nos seus minutos finais de vida. Ele não quer testemunhas para sua morte, mas é, justamente, o que ele obtém: não só assistimos a sua morte, como presenciamos os seus sentimentos mais graves. Remorso, culpa e medo o envolvem nesses instantes – e a atuação marcante de Petrin parece dosar esses elementos de uma tal forma que não conseguimos nem nos apiedar, nem mesmo condenar o homem atormentado pela situação em que se envolveu.

Não fica claro se Kelly cometeu o suicídio ou foi assassinado. O texto, a despeito da conclusão da polícia britânica de que ele teria se matado, deixa a dúvida no ar. É como se ele, o texto, não se permitisse em ser determinante em nenhum aspecto dos relatos, nem mesmo no da soldado americana, que diz não se arrepender dos abusos que cometeu. Este distanciamento só parece diminuir quando se ouve o relato da personagem de Vera Holtz. Diante da crueldade e da tragédia que se apresenta, é impossível ficar indiferente, ainda mais quando ela vem à tona na voz de uma atriz tão experimentada e tão humana em suas atuações. Unimo-nos a sua dor e ao que ela representa. E, embora a realidade dos conflitos nos soe distante, é aí que podemos dizer que estamos envolvidos.

* Texto publicado originalmente em 01/04/2012 na página do Festival de Teatro de Curitiba da Gazeta do Povo Online. Disponível em: http://www.gazetadopovo.com.br/cadernog/festivaldecuritiba/conteudo.phtml?id=1239980.

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